Que Se Danem os Concursos de Beleza

Postagem original 6 de julho

‘’Quer saber?! Que se danem os concursos de beleza. A vida não passa de um concurso de beleza depois do outro. A escola, depois faculdade, depois trabalho, que se dane. E que se dane a academia de força aérea, se eu quiser voar, arranjo outro jeito de voar. É você faz o que ama, e que se dane o resto.’’
Fala do filme Pequena Miss Sunshine, 2006. Essa fala é o ápice da crítica que o filme trás. O filme retrata uma família que, tendo que lidar com suas diferenças, enfrenta momentos de reflexão e quebra de estigmas. Dentre as estórias que o filme mostra, está a da Oliver (interpretada pela atriz Abigail Breslin), que ao ter oportunidade de participar de um concurso de beleza, corre atrás de seus sonhos com ajuda de seus familiares. No entanto, a personagem de Oliver é uma menina que não está no padrão de ‘’mini-miss’’ e, durante seu percurso, é perceptível que a personagem é repelida com padrões de beleza para se enquadrar em uma noção de bonito. Assisti ao filme há muitos anos e o guardo com carinho por ter sido uns dos primeiros filmes que me fez ver que está tudo bem ser diferente, singular e não ser uma boa dançarina também. Não ouvia há muito tempo falar sobre ele. Dia desses descendo pela timeline do Instagram vejo um rosto conhecido: Abigail Breslin. Hoje já adulta, mulher formada, mas de sorriso que não se distancia muito da sua personagem em Miss Sunshine. Como qualquer curiosa, insisto em ler os comentários na foto postada. Dentre comentários saudosistas, me chama a atenção a quantidade de comentários que pontuam o fato da atriz estar mais gorda. Acho normal, afinal, passou-se 10 anos desde que o filme foi lançado e hoje ela é uma mulher, em um corpo de mulher. Continuo lendo os comentários: linda, olha fulano é a miss Sunshine, sicrano quanto tempo dormimos? Ual ela tá linda, gorda feia, orca, que obesa baleia, ela tá ridícula gorda desse jeito. Em dado momento vejo que essa questão do peso de Abigail virá necessidade em destilar padrões em comentários descabidos. Dado momento também esses comentários recebem replica de pessoas que apontam gordofobia e a infelicidade de quererem pautar o peso de uma atriz deverás talentosa.
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Continuo lendo levemente desapontada com a quantidade de comentários maldosos e infundados vindos de nutricionista de Internet e Telespectadores do medida certa. Acho irracional a forma como chamam uma atriz de gorda por não pesar mais trinta quilos, medir 1,20/30 cm e não ser mais uma menina desengonçada em uma tela de cinema e sim em um evento chique que não permite peitos caídos e 70/80 quilos. Afinal, é bonito ver padrões sendo quebrados sim, mas não em meu íntimo. Comentários chamando a atriz de ‘’orca’’ e referindo-se a mesma como ‘’a grande miss Sunshine’’ me causou um leve riso daqueles que damos quando uma pessoa expõe-se ao ridículo sem perceber e a gente assiste sabendo que elas estão erradas. Sempre achei o filme uma sátira, retratando as falhas da sociedade, a erotização precoce, as lacunas de superficialidade que a sociedade sustenta e, sobretudo, o cidadão médio.
Quando li os comentários que denotaram o peso da atriz como algo negativo, entendi mais ainda a mensagem que o filme passa. Perguntei-me se eu e essas pessoas tínhamos visto o mesmo filme, o porquê de preferirem ser tão pobres de discurso e a necessidade que as pessoas têm em destacar algo que vê como negativo apenas para semear uma opinião que acham que é relevante ou própria. A indústria da beleza fatura com a propagação de padrões, mas também ganham com a ideia que as pessoas têm de beleza. As redes sociais fazem as pessoas acreditarem que suas opiniões são relevantes e passiveis de qualquer julgamento ou consequência ao passo que o ciberespaço não é constituído por apenas uma rede. Releva-se racismo, homofobia, preconceito e gordofobia e as consequências não virão porque tudo são piadas e comentário soltos. Abigail Breslin foi linda enquanto criança porque ainda que considerada feia, era uma criança e criança a gente não chama de feia - em público, pelo menos. No entanto, agora ela tá gorda. E ser gorda é sim sinônimo de feiura e descuido.
Introjeção de padrões de beleza faz parte da sociedade. Dos pecados capitais da Igreja Católica a Branca de neve, a vaidade se faz presente também nos pensamentos daqueles que a vê como virtude. Do descarrego em rede de massa ao reducionismo de xingamentos dispensáveis, a questão que as pessoas fazem em degradar o outro é reflexo do desejo de afirmar-se como algo contrário a aquilo que ridiculariza; algo bom e extraordinário, algo melhor que peitos caídos e braços de ‘’mamas italianas’’. Oliver quando chega finalmente ao palco no concurso dança ao som de ‘’Super Freak’’ de Rick James. Não atoa, foi à música que veio a minha cabeça. Super Freak é a plateia que assiste horrorizada Oliver dançar no filme. Super freak são os comentários que fazem sobre o peso de Abigail e, sobretudo, super freak é fazer piada sobre a diferença do outro no ápice de sua intolerância e, deveras, falta de tato e interpretação.
ADM - Rose Oliveira 

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